sábado, 12 de setembro de 2009

Selecção

Abro a porta ao irracional e sigo com o olhar a navalha de barbear. E ela dá meia volta e retalha-me o olho. Azar, com a dor levo a mão à retina tentando que não caia ao chão e descubro-a cheia de formigas. Estas ensaiam a dança do peixe-gato e decidem partilhar-se entre os meus pés de vento e o esqueleto do meu cavalo manco. Uma nuvem esguia passa em frente à Lua e recolhe as contradições das fases. É muito importante na vida ser-se casmurro, e quando se não consegue exprimir o que é devido, bata-se com a cabeça na parede até fazer sangue. A exaltação constante é um quadro de riso explosivo e espasmo. Basta uma testemunha, um leitor que regue a esquelética roseira. Junto a esta apenas o espectro de uma vaca fascina noite fora. Tudo é deterioração da natureza morta ao luar. É nesta que num passe se repousa a cabeça sobre a mesa, num truque para enganar os cães. É que estes sabem que o erotismo deve ser sempre feio, o estético divino e a morte bela.

1 comentário:

  1. Só não concordo com o erotismo sempre feio, de resto parece-me a descrição de um daqueles sonhos que costumo ter em noites estivais. Não sei se é por isso que a sucessão de golpes do texto exerce esta forma de fascínio que me obriga a comentar de forma espontânea, sem olhar para trás.

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